Britto: audiência dos precatórios no TRF-3 pode restaurar dignidade do Judiciário
Blumenau (SC), 12/03/2009 - O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, afirmou hoje (12) que a entidade tem grande expectativa em torno da audiência de conciliação convocada pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região para encaminhar uma solução sobre a questão dos precatórios alimentares não quitados pelo Estado de São Paulo. Britto destaca o entusiasmo da entidade ao ganhar esta semana uma liminar em ação civil pública para obrigar o Estado a pagar esses precatórios, observando que essa medida pode restaurar não só a confiança dos cidadãos na Justiça, mas também a "dignidade do próprio Poder Judiciário" que vinha tendo suas decisões sistematicamente desrespeitadas, na medida em que o poder público tem postergado ao infinito o pagamento desses débitos, ignorando solenemente as sentenças judiciais.
"A ação civil pública de autoria da OAB visou, inclusive, restabelecer a dignidade do Poder Judiciário, quando objetivou fazer com que o Estado cumpra suas decisões, principalmente aquelas de caráter alimentar, urgentes, destinadas a servidores, aposentados, pessoas que até morrem sem perspectiva de receber o crédito reconhecido judicialmente", afirmou o presidente nacional da OAB durante entrevista em Blumenau (SC), onde abriu hoje a reunião do Colégio de Presidentes das 27 Seccionais da OB, na qual o assunto foi dominante.
Para Cezar Britto, se a liminar da Justiça for confirmada, solucionando o débito em precatórios de São Paulo, essa ação pode ter também o mérito de influenciar na tramitação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 12, que tramita no Senado. Isto porque, segundo ele, quem mais pressiona o Senado pela aprovação da chamada "PEC do Calote" é exatamente o Estado de São Paulo.
A seguir, a íntegra da entrevista de Cezar Britto, concedida hoje à imprensa sobre a audiência em que se discute os precatórios paulistas no TRF-3:
P - Qual a expectativa do presidente nacional da OAB para a audiência de conciliação marcada hoje pelo TR-3F em torno da ação civil pública movida pela entidade para obrigar o Estado de São Paulo a pagar os precatórios alimentares com recursos da venda do banco Nossa Caixa?
R - É uma audiência importante, porque quebra uma prática absurda do governo do Estado de São Paulo, que além de não pagar os precatórios nunca se sentou para conversar sobre eles. E o não pagamento dos precatórios significa um calote da dívida pública, mas sobretudo um desrespeito ao Poder Judiciário. Quando o Executivo descumpre uma decisão do Judiciário, ele acena claramente que não respeita um dos poderes que é a base fundamental do Estado democrático de Direito, pois encarregado de aplicar a Justiça. A ação civil pública de autoria da OAB visou inclusive restabelecer a dignidade do Poder Judiciário, quando objetivou fazer com que o Estado cumpra suas decisões, principalmente aquelas de caráter alimentar, urgente, destinadas a servidores, aposentados, pessoas que até morrem sem perspectiva de receber o crédito reconhecido judicialmente. Veja como a questão é absurda no Brasil: aquele cidadão que acreditou no Poder Judiciário e, por assim acreditar, resolveu buscar justiça, no final do processo tem o desprazer de saber que o Estado não cumpre e fica impune. A impunidade do Estado é um desestímulo à luta por justiça no Brasil. Por isso, a OAB em lutado insistentemente para que sejam pagos os precatórios. Esta é uma ação inédita, já que no caso de São Paulo se recebem recursos extras pela venda da Nossa Caixa. E esses recursos extras devem ser aplicados numa obrigação anterior do Estado, uma obrigação para com a Justiça e a cidadania.
P - Essa ação tem um grande significado para a OAB, por se tratar de uma ação contra o Estado que tem a maior dívida em precatórios alimentares (algo em torno de R$ 16 bilhões). Qual a expectativa da entidade de que ações do mesmo tipo sejam propostas contra outros Estados devedores?
R - Quando o Estado que tem o maior poder econômico do Brasil se recusa a cumprir uma decisão judicial, não se tem dúvida de que isso serve de estímulo para os demais Estados. Não o estímulo para o bem, mas o estímulo para o desrespeito à Justiça. Por isso é que essa ação é de fundamental importância: é hora de Judiciário mostrar sua altivez, mostrar sua independência, mostrar que o cidadão tem que acreditar nele, que o cidadão não se desespere em sua luta contra o abuso estatal, porque o Judiciário vai garantir o cumprimento de suas decisões.
P - Então, o senhor está esperançoso de que, desta vez, a Justiça faça realmente fazer valer a decisão de pagar os precatórios, por meio da ação movida pela OAB?
R - Espero nessa audiência que, se o governo do Estado não propor um plano firme, correto, sincero de pagamento de suas dívidas para com os cidadãos, que o Judiciário confirme a decisão liminar, de antecipação da tutela, para mandar bloquear todos os recursos oriundos da Nossa Caixa e destiná-los ao pagamento dos precatórios alimentares.
P - Na avaliação do senhor, haverá reflexo dessa decisão judicial sobre a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional nº 12, a chamada PEC do Calote? Acha que o Legislativo vai avaliar melhor a questão desse novo regime de pagamento pior para os precatórios?
R - Espero que sim, pois o Estado que mais pressiona o Senado pela aprovação da PEC 12 é o Estado de São Paulo. Se nós tivermos um plano sério de pagamento das dívidas de precatórios de São Paulo, decorrentes dessa medida judicial, e não aquele plano absurdo previsto na PEC, de se levar décadas para pagar os débitos de precatórios ou submetê-los a um leilão que, na verdade, significa leiloar o Poder Judiciário, elimina-se o ímpeto daqueles que querem oficializar o calote da dívida pública em precatórios.