Modernização legislativa ainda causa insegurança para empresas
Por Ricardo MontuApesar de vigorar desde janeiro de 2003, o Novo Código Civil, no que diz respeito ao direito de empresa, ainda é objeto de dúvida e insegurança quando o assunto é sociedade. Vale a pena, portanto, refletirmos sobre uma questão essencial no momento em que se faz a opção, quanto ao tipo societário a ser adotado, quando da estruturação de uma atividade, o que irá determinar se esta será empresarial ou não.
A regra do Código Civil considera empresária a sociedade que exerce, profissionalmente, atividade econômica organizada, para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Por sua vez, prevê ainda, por exclusão, que se considera simples as demais sociedades.
Grande dúvida passou a pairar entre os operadores do Direito uma vez que o legislador somente previu o conceito de empresário e de sociedade empresária. Falta, portanto, no nosso Código Civil, o conceito de sociedade simples.
Num primeiro momento passou-se a interpretar a combinação dos artigos 982 e 966 do Código Civil no sentido de que as sociedades simples eram somente aquelas que consistiam no desenvolvimento de atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística, estas sujeitas a registro no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Uma vez não enquadrada a sociedade nessas características eram elas consideradas atividades empresariais, sujeitas a registro na Junta Comercial.
Ocorre, entretanto, que essa interpretação está viciada pela sistemática adotada pelo revogado Código Comercial, onde prevalecia a teoria dos atos do comércio.
A teoria da empresa, trazida do direito italiano, leva em consideração não mais a atividade exercida pela sociedade, como fazia a teoria dos atos do comércio. Nessa nova sistemática, o que deve ser levado em consideração são os fatores presentes no desenvolvimento da atividade, que a classificará como empresarial ou não.
A empresarialidade, portanto, se caracteriza pela conjugação dos fatores: (1) exercício profissional (2) de atividade econômica, (3) organizada (4) para a produção e circulação de bens ou de serviços.
Obviamente que o surgimento, em nosso ordenamento, dessa nova sistemática, a da sociedade simples, tem por finalidade promover a simplificação das regras para aqueles que, reunidos em sociedade, possam desenvolver atividades de pequena complexidade em sua operação, ainda que não seja ela uma atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística.
Portanto, o que se quer mostrar é que nada impede o registro, na Junta Comercial, dos atos constitutivos de uma sociedade que tenha por objetivo atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística, de maneira que, se assim o fizer, esta passará a ter natureza jurídica empresarial. Quanto a isso não pairam dúvidas.
Entretanto, o que não se assimilou, ainda, é que nada impede a inscrição, no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, de qualquer atividade, salvo exceções expressamente previstas em lei, ainda que esta não seja intelectual, de natureza científica, literária ou artística. Isso significa dizer que atividades de pequeno grau de complexidade, que não estejam revestidas da soma dos requisitos da empresarialidade - (1) exercício profissional (2) de atividade econômica, (3) organizada (4) para a produção e circulação de bens ou de serviços — podem se constituir sob a forma de sociedade simples.
É importante que tenhamos plena consciência acerca das mudanças que a revogação da teoria dos atos do comércio e a adoção da teoria da empresa têm trazido ao contexto prático das relações de negócios. Somente assim é que seremos capazes de usufruir da modernização legislativa que ocorreu com o advento do Novo Código Civil, naquilo que se refere à parte de Direito de empresa.