PEC dos Precatórios alterada
Brasília, 07/05/2009 - A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que prolonga o prazo para o pagamento de precatórios (dívidas da administração pública decorrentes de uma decisão judicial definitiva) será alterada na Câmara Federal. A afirmação é do relator da PEC, aprovada no Senado no mês passado, deputado Eduardo Cunha (PMDB RJ), que aponta dois itens inconstitucionais na medida. Um deles determina o pagamento da dívida de estados e municípios, avaliado em R$ 100 bilhões, de acordo com uma ordem crescente de valor das dívidas, ao contrário da ordem cronológica definida pela Constituição. O outro prevê a substituição do índice atual (inflação mais juros de 12% ao ano) pela taxa de caderneta de poupança, inferior à primeira.
Temos que tentar atender estados e municípios que estão em dificuldade, mas sem atingir a ordem constitucional, afirma o deputado. Cunha pretende realizar uma audiência pública em até duas semanas para discutir o assunto, antes de apresentar seu relatório à Comissão de Constituição e Justiça da Casa.
Ontem, uma marcha contrária à aprovação da PEC, organizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), caminhou da sede da entidade em Brasília até o Congresso para pressionar a Câmara a não aprovar a proposta. A manifestação reuniu cerca de 1,5 mil representantes do Judiciário, Ministério Público, advogados e membros de organizações não governamentais com precatórios a receber.
De acordo com a PEC, de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB AL), o pagamento da dívida poderá ser realizado em até 15 anos. Hoje, esse prazo é de 18 meses, mas o período não é respeitado pelos devedores, apesar de ameaças de sequestro de recursos e intervenções. Tem uma senhora nessa passeata de 90 anos. Você acha que ela vai esperar quanto tempo (para receber o precatório)? Tem um limite de vida também, afirmou Maria Isabel Locateli, 54 anos, integrante do Sindicato dos Especialistas de Educação do Município de São Paulo (Sinesp).
Com a PEC, os estados e municípios devedores poderiam destinar uma parcela fixa de sua receita para o pagamento dos precatórios. A fatia da receita a ser destinada aos precatórios seria de até 1,5% para os municípios e 2% para os estados. Ainda segundo a PEC, parte da dívida poderá ser paga por meio de leilões: aqueles que aceitem receber com maior deságio (quantias inferiores à dívida original) serão os primeiros beneficiados.
Advogados e magistrados apontam a medida como uma afronta às decisões do Poder Judiciário. O cidadão não consegue ser beneficiado pelo meu trabalho porque aquilo que eu decidi passa a ser negociado pelo Estado. Todo o trabalho que o Judiciário teve para desenvolver o processo fica a perder de vista. (A PEC) é um verdadeiro golpe contra a decisão do Judiciário, afirma Cláudio Montesso, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho.
O presidente da OAB, Cezar Britto, entregou ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), uma carta-manifesto assinada por 166 entidades contrárias às mudanças propostas pela PEC. (A medida) é o maior atentado à democracia brasileira depois do golpe militar, porque ela diz que os governantes estão livres para abusar do cidadão. Um país em que o governante é livre e o cidadão está amordaçado não é um pais democrático, afirmou. (A reportagem é de Flávia Foreque e foi publicada na edição de hoje do jornal Correio Braziliense)