Sociedade se mobiliza dia 6 contra o calote oficial em votação na Câmara
Curitiba, 26/04/2009 - A polêmica proposta de emenda constitucional dos precatórios enfrentará fortes resistências durante seu trâmite na Câmara. Entidades ligadas ao Judiciário já se manifestaram contra o texto aprovado no Senado no início do mês e organizam uma marcha prevista para o dia 6 de maio, a fim de pressionar por mudanças no projeto. Na avaliação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) a PEC retira o efeito das decisões judiciais, trazendo vantagens somente para os entes devedores, em detrimento dos cidadãos que tiveram seus direitos assegurados pela Justiça. "A marcha é para convencer a não dar poder absoluto ao Estado a lesar o cidadão impunemente", afirma o presidente da OAB, Cezar Britto. Caso a manifestação não surta efeito, a Ordem entrará no Supremo Tribunal Federal com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a PEC.
Para Cezar Britto, a proposta agride o sistema de freios e contrapesos entre os poderes. A PEC altera todo o sistema de pagamento dos precatório, autorizando governos estaduais e municípios a criar um fundo especial para pagamento de precatórios, cujo valor depositado seria um percentual de suas receitas correntes líquidas. Do total depositado no fundo, 60%, seriam usados para pagamento via leilão - em que os credores poderiam optar em receber valores menores do que o definido por sentenças judiciais. Os 40% restantes seriam usados para pagamento em ordem crescente de valor. Atualmente os precatórios são pagos em ordem cronológica. Na avaliação de Cezar Britto, os porcentuais estabelecidos na PEC são muito pequenos para que se possa pagar de forma satisfatória os precatórios. "Em síntese, os governos e prefeituras poderão abusar dos direitos do cidadão. Isso apequena a Justiça." Para ele, as regras propostas impedem o Poder Judiciário de controlar as ações do Executivo, que poderá transgredir o direito dos cidadãos impunemente, já que o pagamento poderá demorar anos.
Para o presidente da AMB, juiz Mozart Valadares Pires, a proposta penaliza o credor do poder público, por submeter o cidadão que tem direito ao pagamento integral de uma dívida a leilões que vão reduzir o valor que deveria ser recebido. "Isso é um desrespeito às decisões judiciais. Na mesma semana em que os chefes dos três poderes assinam o segundo Pacto Republicano, para dar maior eficácia às decisões judiciais, o Senado aprova uma PEC em sentido contrário."
Para o advogado Ricardo Luís Marçal Ferreira, presidente do Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares do Poder Público, a aprovação da PEC na Câmara trará incerteza ao cumprimento de decisões judiciais. "Como a proposta estabelece somente um porcentual muito pequeno de recursos a serem vinculados ao pagamento de precatórios, os estados e municípios vão ficar numa situação confortável, pois somente teriam sanções, como sequestro de valores, se descumprissem esses percentuais mínimos", explica ele. "O sistema, com isso, torna-se extremamente vantajoso para devedores, abrindo um flanco para a desvalorização da Justiça".
Como os estados e municípios não precisam se comprometer além do mínimo, avalia, os pagamentos de precatórios poderão demorar cerca de 20 a 30 anos. Ferreira critica também a tentativa da instituição de leilões de precatórios e a mudança da ordem cronológica para a que usa como parâmetro o menor valor de precatórios. "O cidadão está esperando dez anos para ser pago e vai ter de dar um lance num valor menor do que lhe é devido, concorrendo com outros credores?", questiona. (A matéria é de autoria do repórter Rhodrigo Deda e foi publicada hoje no jornal Gazeta do Povo)